quarta-feira, 2 de novembro de 2011

CAPITAL X TRABALHO


Ilustração: Flavio Morais

Somos títeres
Nas mãos de déspotas
Dão-nos víveres
De boa ingesta
E segue a festa
A nós: pão e circo
A eles: tudo o que resta.

UM QUE TENHA



"Navegar é preciso". Necessário ou exato, sei lá eu! O que verdadeiramente importa é que, navegando nas caudalosas e imprecisas águas da Internet, deparei-me com o surpreendente blog Um que Tenha (pode escolher, desde que seja UM QUE TENHA). O sítio disponibiliza um inestimável acervo musical, com álbuns raríssimos e completos para download gratuito, abarcando uma considerável parcela de artistas, autores, intérpretes, músicos etc. do nosso belíssimo cancioneiro brasileiro. A política do referido blog, segundo o próprio autor, é "divulgar a música e os artistas brasileiros e difundir o prazer de ouvi-los, sem que isso resulte em ônus ou benefício financeiro direto ou indireto para ninguém". Fantástico! A única restrição do blog - o que eu, como fiel partidário da pirataria, considero um pequeno pecado - é que são disponibilizados tão-somente álbuns lançados a mais de três anos (alguns, inclusive, já fora de catálogo), o que, convenhamos, dada a infinidade de raridades musicais das mais variadas épocas postas a dois cliques dos nossos ouvidos, é perfeitamente perdoável. Para aqueles que, como esse que cá rabisca, amam a música brasileira e a consideram única e superior, é um prato fundo cheio!

Um clique na imagem acima remete ao blog e o link permanecerá ali no [b]ionicão RECOMENDA.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

COISAS

Se as coisas não vão bem
Ao menos elas existem: as coisas e seus devires
Pois, se nada mais existir para ir ou vir, mal ou bem
Aí, as coisas vão mal, mesmo. Muito mal...
Sabê-las e senti-las indo ou vindo
Mal ou bem
É, como as coisas, existir também.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

AINDA SEM MUITO O QUE DIZER...


Ter um blog não significa, em hipótese alguma, compromissar-se a escrever periodicamente, mas, sim, possuir um espaço adequado em que se possa escrever de forma irresponsável e desobrigada, sempre que se lhe aprouver, e ainda correr o sério risco de ser lido.

Acho que ando levando muito a sério a primeira parte dessa assertiva. Quanto à parte final, considero o risco remoto e aceitável.

sábado, 22 de outubro de 2011

VOLTANDO...

... sem muito o que dizer. Escutemos música, então. Deixo-lhes na companhia da excelente Roberta Sá, interpretando a belíssima Pressentimento, de Élton Medeiros. Mais um flerte entre duas gerações do samba a provar que nem tudo está perdido. Ali, no ESCUTA ESSA!

sábado, 8 de outubro de 2011

PRATO FRIO

Serviram-mo frio
Sem acompanhamentos
Salvo a tristeza e a culpa
Meus fiéis circunstantes

Queria-o quente, agora
Muito embora
Outrora
Quando me servido quente
Não o tenha sabido apreciar a pleno

Queria-o quente
E corresponder à quentura
Com toda a candura
De que nunca dispus

Nunca o tinha pensado frio
Sempre serviram-mo quente
E quente fazia-me bem
Quente, era-me o alento
A referência subjacente
O mais belo sustento
De quem, em pleno vôo
Alçado faz muito
Sabia-se, ainda, mero rebento

Serviram-mo frio
Caiu-me indigesto
Passei muito mal
Confesso, chorei

Não há mais o ninho
No qual fiz-me homem
No entanto, resta o legado
De amor e carinho
E de ser quem eu sou

Serviram-mo frio
Nem vinhos, nem pães
Apenas, tão-só
O corpo da mãe.

domingo, 24 de julho de 2011

PRIMEIRAS IMPRESSÕES DE UM FÃ LEIGO

Um breve chio como prenúncio, um I tônico, porém discreto, e um corte seco e conclusivo: CHICO.

O título do mais recente disco de Chico Buarque não poderia ser mais apropriado. Sintetiza com plenitude o teor lírico e minimalista do álbum, onde a concisão se faz presente até mesmo na quantidade de faixas: apenas dez - a qualidade sobrepondo-se à quantidade, mais uma vez.

CHICO (2011) ratifica definitivamente o viés literário e romântico que o autor vem imprimindo às suas canções já há algum tempo, o que nos faz recordar do Chico político e engajado com uma certa nostalgia. É uma obra de pouca firula, nenhuma pirotecnia e um lirismo comovente. As canções são de uma sonoridade desconcertante, podendo-se perceber nitidamente cada instrumento com seus timbres característicos, cada nota e cada pausa. As melodias, como em As Cidades (1998) e Carioca (2006), são complexas e pouco "orelháveis", exigindo um pouco mais do que uma primeira audição para serem decifradas e bem saboreadas. As letras, em momentos, desafiam saborosamente a prosódia e a boa métrica, o que, embora gere um estranhamento inicial, leva-nos à conclusão, após nos aproximarmos delas, de que não poderia ser de outra forma sem perder boa parte da beleza. Enfim, um primor. Deguste-o sem parcimônia.

sábado, 16 de julho de 2011

ESTAVA SEM NADA PRA FAZER...

Numa vã tentativa de pejorar (não te acanhes em usar o Dicionário de Português, ali, à direita. He, he...) este humilde pasquim digital, cuspiram-me a cara com o seguinte maledicente dizer: "quando não tenho nada pra fazer, leio o teu blog". Curiosamente, a cusparada me fez bem. Considerei que as mais prazerosas coisas que eu cotidianamente faço, faço-as quando nada mais tenho a fazer (entre outras coisas, escrever). Afazeres, primeiro; prazeres, depois. Meus prazeres não são agendados ou premeditados, são espontâneos e imprevisíveis. Portanto, não posso querer o [b] como mais uma tarefa ou compromisso inadiável para os meus já tão assoberbados leitores – tampouco para mim, que o concebo com incomum regozijo. Este panfleto virtual pretende-se somente prazer descompromissado, livre de agendas ou cartões-ponto. O dito, embora ferino na essência, fez-me sentir vitorioso, coroando minha pretensão – e, de lambuja, ainda rendeu-me este post, que alguém talvez leia quando mais nada tiver pra fazer. Quando mais nada há que se fazer, resta o prazer.

RECAÍDA

Sei que não posso
Compreendo: não devo
Mas, hoje, só hoje
Eu me permito
Pois hoje eu mereço
Hoje eu preciso
Se quiser - mas não quero -, eu evito
Eu é que sei de mim e do preço

Engano-me somente a mim
Com esse ardil
Sofisma vil
No qual nem eu acredito.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

CHICO

ELE está de volta!
É no dia 20 de julho!


Chico: Bastidores (2) from Chico Buarque: Bastidores on Vimeo.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

SÓ ME RESTARAM MEUS SONHOS

Meus sonhos vão além de mim
Muito além do meu alcance
Logo, não convém alimentá-los
Mais que o tirano a seus vassalos
Eis que são inalcançáveis
Eis que são inacessíveis
São, sim, irrealizáveis!
Mas, de fato, são incríveis
Belos, memoráveis
Cultivo-os um a um, qual flores
Rego-os todo dia
Parcimoniosamente
Para que não cresçam em demasia
Água na mais justa quantia
Para que não morram, somente
Mas, também, não sintam dores
Converso com um e outro
Dia sim, noutro também
Para que se saibam sonhos meus
E jamais de outro alguém
Para que se entendam sonhos
Nada além
E que não nutram rancores
Por quem
Quer-lhes somente a si, como a um bem

Eloqüência e pouca água
É a dieta que os imponho
Sonho meu não vinga
Sonho meu não brinca
De transcender, de ser real
Não reclama, não chia
Não me afronta
E não deixa de ser sonho
Por destino ou teimosia
Não desperta, não desponta
Não me deixa em desamparo
Enfrentando a realidade
A sós
Sem sonhos
Sem vida
Na saudade...

Sonhos meus são sempre sonhos e sempre meus.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

PT ≠ ESQUERDA

Aqueles que me conhecem minimamente sabem: incompatibilizei-me totalmente com o Partido dos Trabalhadores, com cuja ideologia, sustentada heroicamente noutros tempos pelos seus quadros, identificava-me plenamente. Hoje, sigo acreditando naquela ideologia, contudo, não mais na sigla. Sigo esquerdista e utopicamente comunista. Já o PT, rejeitou solenemente toda a sua história e converteu-se (revelou-se?) numa agremiação centro-direitista, com todas as honras a que o ignóbil ideário pode remeter. Hoje, dada a guinada brusca à direita protagonizada pelo referido partido, sou o mais ferrenho crítico de Luis Inácio e seus asseclas, embora o senso de justiça que ainda me resta faça-me reconhecer, de lupa na mão, os raros pontos positivos de sua gestão bi-mandatária - pontos que não identifiquei no ainda incipiente governo de sua legatária.

Agora, o triste!, o lamentável!, o quase insuportável! desse intróito todo são os indesejáveis "aliados" que ando involuntariamente angariando! Seres cuja ignorância política e a obtusidade intelectual os fazem crer que a minha aversão ao PT, tanto quanto as suas, é motivada pelas mesmas razões. Analfabetos políticos que se regozijam ao suporem que encontraram, na minha pessoa, mais um ser iluminado que não admite um presidente oriundo das classes sociais mais humildes, semi-analfabeto e sem graduação superior. Liberais clássicos e neo-liberalóides que confundem uma crítica fundamentada e lógica com pareceres estéreis e impregnados de preconceito e desconhecimento, e destilam estes, amparando-se inapropriadamente naquela. Gente que, ainda hoje, considera - pasmem! - o Partido dos Trabalhadores o grande representante da ideologia de esquerda no Brasil, e tão-somente em nome dessa crença equivocada ainda o criticam. Criaturas imbecis que nunca se deram conta de que, tempos atrás, quando se autopropagavam orgulhosamente antipetistas, padeciam, em verdade, do direitismo reacionário e do conservadorismo congênito, males que hoje afligem o próprio Partido dos Trabalhadores.

Então, em vista de um fato qualquer no noticiário nacional, eu baixo o cacete no PT - hoje, um partido de linha centro-direitista. Saltam, sei lá de onde, inúmeros antipetistas históricos - eternos direitistas - endossando minhas palavras, fazendo-as suas e tirando-me pra compadre. Instantaneamente, crêem-se meus aliados ideológicos e incitam-me para que prossiga nas críticas, com as quais deleitam-se. Nauseabundo, penso em vomitar-lhes a cara com os impropérios esquerdistas do mais grosso calibre de que disponho, pondo-lhes no merecido lugar. Mas, recuo, sopeso, e concluo: perda de tempo...

Hoje, o PT é sangue do sangue deles, mas a ignorância faz-lhes cortar a própria carne e exibi-la com orgulho.

POETA ARROGANTE

Curioso, isso de ser poeta
Curioso e intrigante...
Dia desses, vi poesia numa garrafa térmica!
Outro dia, pessoas de maus-semblantes inspiraram-me bons-versos
Já despertei, sobressaltado, no meio da noite, com estrofes inteiras chacoalhando-me na cama
Ignorei os eventos, um a um, com indiferença e soberba
A poesia se oferecia; eu a desprezava
Afinal, sou poeta - pensava
Sou sujeito, e a poesia, objeto, que não existe, senão por mim

Hoje, descobri que existe, sim...
E, pelo visto, não quer mais saber de mim
Eis que a reclamo, desesperadamente
E ela me ignora, solenemente.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

ENCANTOS

Dona Adélia não mais se encanta com Paris, capital francesa que a recebia, no mínimo, duas vezes ao ano em jubilosas e dispendiosas visitas. Encanta-a, agora, seu primeiro neto, de três meses incompletos. Há quase noventa dias a cidade-luz de Dona Adélia anda às escuras.

Larissa nunca foi a Paris, não tem filhos, tampouco netos, mas tem-se encantado sobremaneira com a leitura de O Vermelho e o Negro. Seus livros são, por enquanto, seus únicos filhos que, nessa condição, não fazem senão encantá-la.

Zé da Viola, dia desses, num arroubo de melancolia, desencantou-se com o seu próprio samba. Este, por sua vez, continua encantando a tantos e tão profundamente a ponto de fazer com que o desencanto de Zé não faça sentido algum - mas Zé é teimoso. A despeito do desencanto, Zé da Viola canta e ainda encanta a todos que o ouvem.

Encantam-me dois pares de olhos verde-azuis, e me determinam. Sei que, sob suas vigílias acolhedoras, torno-me melhor. Tento corresponder à altura, mas, quando estou quase alcançando o cume, resvalo e despenco ao chão, mantendo-me inerte até que me ressurjam forças para retomar a empresa. Talvez essa sísifa tarefa seja a chave do encantamento. Dois lindos pares de olhos verde-azuis: eles são a minha cidade-luz, o meu romance épico, o meu samba-canção, a razão das minhas razões.

Encantos...

sábado, 7 de maio de 2011

ANTIASSUNTOS

Amanheci o sábado com uma irrefreável vontade de rabiscar algo. Mas o quê?

Poderia, como tantos o fazem, discorrer um pouco sobre religião - o ópio do povo, já asseverou Marx -, todavia, não sou dado aos sectarismos e dogmatismos que permeiam todas as confissões religiosas vigentes. Não sou partidário de religião alguma, portanto, fujo do tema tal qual o diabo, da cruz (sem interpretações literais, por favor). Ademais, encher lingüiça em nome de Deus deve ser um puta sacrilégio. Tô fora!

Futebol? Aí estaríamos transpondo o campo das superficialidades e adentrando ao profundo abismo das frivolidades. Não que eu negue a minha infeliz e trágica condição de gremista que acompanha os jogos do seu clube pela TV e pelo rádio. Admito, gosto de futebol, mas não o considero mais do que um doce entretenimento, diferentemente dos idólatras que dedicam seus domingos à deusa bola e seus asseclas, que ascendem sob a égide do euro e da ignorância. Aprazível, de fato, mas estéril. Futebol, para mim, jamais foi algo mais do que um desligamento temporário dos motores. São noventa minutos de total renúncia cognitiva em que se procede a um providencial zeramento da memória, gritam-se alguns palavrões inadmissíveis e bebem-se algumas cervejas. Agora, fazer do consagrado esporte bretão tema de postagem cá no [b], seria, na minha escala de valores, elevá-lo a um patamar absolutamente imerecido.

Então, como todos podem ver, optei por não escrever sobre religião nem futebol. E ao fazê-lo, escapuliu-me, subitamente, a outrora irrefreável vontade de rabiscar algo. Daí, calei-me.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

SEXTA-FEIRA SANTA

Hoje é dia de CHURRASACO!


Pro inferno com convenções religiosas hipócritas e dogmas irracionais, perpétuos e escravizantes! Hoje eu vou comer churrasco e tomar cerveja, exatamente como jamais deixei de fazer sempre que me deu vontade. Datas a parte: todo dia pode ser dia de churrasco!

Perdoa-me, Deus. É que eu não gosto de peixe.

sábado, 26 de março de 2011

NOTA DE ESCLARECIMENTO

Quanto ao post "PATROCÍNIO", de 27 de fevereiro, impõe-se um esclarecimento: não, não estive doente. Quis apenas dedicar uma singela homenagem àqueles(as) cuja lamentável e desprezível existência resume-se a tão-somente pitaquear inconvenientemente a vida alheia (nossa vida é cuidar da sua). Mas cabe o registro: lisonjearam-me muito as manifestações de preocupação. Obrigado a todos.

Ah! E tranqüilizem-se, pois, se não entenderam o teor do post, é porque, certamente, estão imunes a ele. Quem tinha de entender entendeu.

Mais do que nunca, se desgosto, ODEIO!

DICOTÔMICO

Quando eu gosto, eu amo
Se desgosto, odeio
Sou assim mesmo e não me acanho
Dois extremos antagônicos
Sem nada no meio
Sou dicotômico

No meio vinga o irônico
O dissimulado, o hipócrita
O meio é e não é
Convive com lá e cá
Num torpe balé
Não se define, acovarda-se
Não manifesta, cala-se

Não me acovardo: se gosto, amo
Não me calo: se desgosto, odeio
Assim me autoproclamo
Aos brados e sem receio
De melindrar seja lá quem for
Sou a tese e a antítese
Sem o menor compromisso com a síntese
Não a anseio
Sou dois pólos que se repelem
Sem pudor
E sem nada no meio.

domingo, 27 de fevereiro de 2011

PATROCÍNIO

Minha semana teve o patrocínio de...
 

sábado, 26 de fevereiro de 2011

CHICO, DAI-ME VOZ


Grande Chico! Novamente, como em muitas outras oportunidades, valho-me dos seus versos - sempre belíssimos e, por vezes, ferinos - para expressar-me melhor do que eu mesmo seria capaz de fazê-lo. Lá em cima, à direita, no ESCUTA ESSA! A canção/reprimenda Injuriado encontra-se no álbum As Cidades, de 1998, interpretada pelo próprio autor em duo com sua irmã, Cristina Buarque. Grande Chico!

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

TRISTE?

Triste? Triste mesmo é prejulgar, é proferir sentença sem a adequada fundamentação. Triste é preconceituar, é definir de antemão o que é certo e errado, como se o seu Deus assim lhe houvesse permitido (talvez o tenha feito. Sei lá eu...). Triste é condenar à revelia. Triste é outorgar-se a si mesmo plenos poderes para decretar veredictos definitivos - embora vazios e autoritários - sem a mínima qualificação para fazê-lo. Triste é presumir baseado em versões unilaterais e sem qualquer conhecimento de causa. Triste é meter a colher no angu alheio e maldizer os caroços, que não lhe dizem o menor respeito. Triste, muito triste, é cativar sem correr o menor risco de ter de assumir responsabilidades e achar isso o máximo. Triste é desaprovar quem não cativa ignorando as suas razões e circunstâncias. Triste é não ter a menor noção de responsabilidade e, mesmo assim, prescrevê-la aos outros. Triste é acreditar ingênua e presunçosamente que tais posturas contribuem para melhorar a vida de alguém. Triste é crer-se legítimo detentor de alguma espécie de salvo-conduto para assim proceder. Triste é arrotar merda e sentir perfume de rosas.

Agora, digo-lhes: triste mesmo é ser, gratuitamente, vítima de tudo isso.

A despeito do sorriso que eu, acidentalmente, possa-lhe dirigir, estou irremediavelmente triste.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

VINHO E LITERATURA

De vinho, tudo o que sei é que é feito de uva - ou, ao menos, deveria ser. Sei também que, segundo um provérbio latino, "a verdade está no vinho", ou, no próprio latim, "in vino veritas" - só pra dar uma leve esnobada (santa Wikipédia, desde 2001 subsidiando a pseudo-intelectualidade mundial). Contudo, aprecio um bom vinho, e creio que o tenho feito dignamente. Sei de seus sabores de senti-los e não de entendê-los. Em dias de baixa graduação térmica, busco a verdade no aconchego das elevadas graduações alcoólicas de um bom Cabernet Sauvignon, sem a menor pretensão de decodificá-lo ou explicá-lo. Sou um enófilo, não um enólogo.

Pois, dia desses, num contexto diverso, lembrei-me do vinho e a relação amistosa que mantínhamos um com o outro.

A pauta era literatura, mais precisamente o grande Dostoiévski. A conversa era franca até que, há uma certa altura, acirrou-se o debate e o meu interlocutor, num compreensível instinto de autopreservação (confesso, provoquei-o), disparou-me desafiadoramente: "muito pior do que não ter lido Dostoiévski é tê-lo feito sem o ter entendido", insinuando claramente que eu o teria feito desse modo. Absorvi o golpe em silêncio e tratei de elaborá-lo.

Então, faço o entrelaçamento, a analogia que se impõe: a boa literatura, assim como o vinho de qualidade, deve necessariamente ser entendida para ser bem-apreciada? Quem sou eu para presumir que decifrei Dostoiévski? Ou Kafka, ou Machado, ou qualquer outro grande mestre da literatura? Se, na "minha" A Metamorfose, Gregor Samsa metamorfoseara-se em barata e, na "tua", em um grilo (ou, numa terceira ótica, contrariando todo o senso-comum vigente, não se metamorfoseara em coisa alguma), pode-se afirmar, categoricamente, que eu entendi o autor, enquanto tu não o foste capaz de fazer? Absolutamente! A grande literatura não é senão para que nos entendamos a nós mesmos, jamais para que decodifiquemo-la como um tratado filosófico ou uma consolidação de decretos. A arte é subjetiva e não carece de razões ou silogismos. Entendamos isso.

Eu me entendi melhor após ler Dostoiévski. Talvez até não o tenha compreendido de pleno, mas na busca vã de fazê-lo um dia, vou relendo-o e entendendo-me cada vez mais.

Sei lá se o aroma é frutado ou, a narrativa, expressionista, o que sei é que a verdade está na literatura e no vinho. Quando quero mentir, bebo cerveja.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

REENCONTROS

Esta me está sendo a semana do reencontro.

Primeiramente, um súbito, porém adorável, reencontro comigo mesmo. Fiz as pazes com minhas circunstâncias e ando flutuando. Sem maiores detalhes.

Segundamente (he, he, he... brincadeirinha. Reencontrei-me com o bom-humor, também), o inevitável reencontro com o trabalho (???), após um bela dezena de dias regados a Heinekens e água salgada.

Por fim, o reencontro premeditado - razão do presente post: conforme lhes havia sobreavisado, iniciei a releitura de 1984, a fantástica distopia orwelliana (relativo a George Orwell, pseudônimo de Eric Arthur Blair, escritor inglês entre os mais influentes do século XX). Estou, em verdade, reencantando-me com a obra, cujo teor incrivelmente premonitório havia-me desconsertado já quando da primeira leitura, há nove anos. Contudo, hoje, os matizes são muitíssimos mais nítidos e sugestivos, os temperos são mais agressivos e a boca do estômago dói mais após o soco - em síntese: o mesmo livro, um novo leitor. Estou extraindo do que eu supunha só bagaço a quinta-essência do fruto, a sua doçura quase completa. Reservo o melhor, ainda, para uma terceira leitura.

Aos primeiranistas, uma breve sinopse da obra (caso desperte-lhes interesse, não se privem de experimentar. Vale muito a pena.):

Winston, herói de 1984 [o livro foi escrito em 1948], último romance de George Orwell, vive aprisionado na engrenagem totalitária de uma sociedade completamente dominada pelo Estado, onde tudo é feito coletivamente, mas cada qual vive sozinho. Ninguém escapa à vigilância do Grande Irmão, a mais famosa personificação literária de um poder cínico e cruel ao infinito, além de vazio de sentido histórico. De fato, a ideologia do Partido dominante em Oceânia não visa nada de coisa alguma para ninguém, no presente ou no futuro. O’Brien, hierarca do Partido, é quem explica a Winston que 'só nos interessa o poder em si. Nem riqueza, nem luxo, nem vida longa, nem felicidade - só o poder pelo poder, poder puro.'

sábado, 29 de janeiro de 2011

DEVANEIO

Não sou escritor, sou apenas um homem que escreve. Seria muita presunção querer erguer-me à olímpica condição de escritor - afora a responsabilidade que demanda o ofício, cujo peso não suportaria. Não sou, nunca fui e tampouco pretendo sê-lo. Escritor, não. Apenas um homem, como tantos outros, que escreve. Acho que escrevo para provar a mim mesmo que estou vivo. Talvez eu não pare de escrever ao morrer, mas certamente morro ao parar de escrever.

domingo, 23 de janeiro de 2011

ACREDITO QUE SEJA ASSIM

O que, em suma, traz-nos realmente felicidade?
O dinheiro, dizem, manda buscar. Mas sabemos que esse dito não passa de um bem-humorado gracejo cotidiano.
O amor? Não. Este traveste-se de anjo e, perfidamente, desembainha a lâmina oculta sob suas asas e apunhala-nos pelas costas - inclusive quando mais esperamos.
O único elemento capaz de fazer-nos verdadeiramente felizes é ela: a ignorância.
O tamanho da nossa ignorância dá-nos a real medida de nossa felicidade, numa relação direta e viciosa. E o grau de alheamento que mantemos em relação a ela determina a sua amplitude e longevidade.
Somos tanto mais felizes quanto menor for a consciência que temos de nosso próprio obscurantismo intelectual.
Ignorar a própria ignorância é o pináculo da felicidade humana.
Dar-se conta dela é ir-se desviando perigosamente do confortável caminho que conduz á verdadeira felicidade.

Adoraria ignorar tudo isso...

sábado, 15 de janeiro de 2011

RELEITURAS

Pretendo, este ano, dedicar-me à releitura de muitos bons livros que não receberam, de minha parte, o devido tratamento, quando da primeira vez lidos, em função de uma relativa imaturidade literária minha. Li Crime e Castigo com apenas 23 anos de idade. Certamente, ser-me-á outro livro aos 37. Raskólnikov, protagonista do supramencionado romance de Dostoiévski, e Julien Sorel, personagem de Stendhal em seu magnífico O Vermelho e o Negro (outra grande obra a ser redescoberta), soar-me-ão ainda mais jovens e irrequietos diante das minhas atuais quase quatro décadas de vida (bem-vividas).

Além dessas, quero reler, ainda, muitas outras obras que me marcaram profundamente, tais como:

1984, a fantástica distopia de George Orwell.

Alguns contos de Franz Kafka, essencialmente A Construção e Na Colônia Penal - para mim, os mais impressionantes do escritor tcheco.

O Escritor e seus Fantasmas, do argentino Ernesto Sábato. Para quem faz do escrever sua ração diária, um prato delicioso de ser saboreado.

Três livros cujas leituras dei início, sem concluí-las: Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa (regalo da minha amada); Guerra e Paz, de Tolstoi e Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley.

Começo esta desconcertante jornada nesta semana, com 1984, de George Orwell.

ESCRITOS QUE NÃO ESCREVI

Toda vez que penso em escrever algo, padeço de um híbrido de medo e vergonha de fazê-lo. Não que meus escritos envergonhem-me perante meus episódicos leitores. Longe disso. Meus benevolentes leitores até que gostam - ou mentem-me que gostam - dos meus rabiscos. A censura que se me impõe é interna, é de mim para mim mesmo. Sinto medo de dar à luz uma criatura que me desagrade, que não me satisfaça a contento, que não me envaideça como presumi que o faria. Apavora-me a possibilidade de o resultado não ser digno do previamente idealizado. E se isso ocorre, envergonho-me profundamente.

Então, privo-me de escrever. Covarde, elimino a possibilidade da derrota, refugiando-me na impossibilidade do êxito.

Os escritos que não escrevi ocupariam laudas e laudas, em fonte minúscula. Mas não o fazem. Apenas coroam, de forma patética, minha vergonha e meu medo - e minha covardia!

As linhas que ora lês seriam mais um escrito que eu não escreveria, mas... fodam-se! Escrevi! E não estou envergonhado.

sábado, 1 de janeiro de 2011

E POR FALAR EM PRECONCEITO...


1º CASO

Dois grandes amigos (um, branco, outro, negro), irmãos por escolha mútua, encontram-se após anos:

- Fala, negão!!! Quanto tempo! Dá cá um abraço, seu filho-da-puta!

2º CASO

Cidadão negro, desacompanhado, solicita acomodações em hotel de luxo:

- Um quarto, por favor.
- É para o senhor mesmo!?


Palavras, por si só, não discriminam. Pessoas discriminam. O negão do primeiro caso não invejaria o "augusto" tratamento dispensado ao senhor do segundo.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

ATENTEM PARA O PERFUME!


Por que é que as pessoas, de regra, tendem a supervalorizar o que não têm, elevando-o a um patamar de importância capaz de suplantar tudo o que já possuem - o que, invariavelmente, não é pouco e é lindo? Ninguém é cem por cento feliz; é utópica tal pretensão - e frustrante. Três quartos de felicidade, convenhamos, já é felicidade sem tamanho, mas os famigerados vinte e cinco por cento faltantes teimam em cegar-nos para os adoráveis setenta e cinco de que dispomos. Creio que acabo de revelar a fórmula secreta da infelicidade - e, por exclusão, seu antídoto.

Tá certo, os espinhos da rosa espetam doídos... mas que perfume!!

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

SONETO DA TRAIÇÃO

Sempre me agigantava em teu desvelo
Seguro nos teus muitos braços fortes
Mas, hoje, pude ver, sem querer vê-lo
Teu mais cínico ato, sem recortes

Amei-te de um amor cego e inocente
E fiz desta paixão brioso escudo
Por nós, fiz-me, na guerra, combatente
Injuria a teu respeito!? ALTO! CALUDA!

A sós, sabia bem, não era nada
Portanto, quis-nos juntos, e rumamos
Até que me expurgaste em meio à estrada

Em nome de algo que não conclamamos
Traíste-me. O amor não deu em nada
Tomaste o descaminho. Onde é que erramos?

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Pertinente, novamente. Como há cinco meses...